março 17, 2006

O terror vem de Minas Gerais

17/3/2006
Por Arthur Soffiati
Jornal do Meio Ambiente

Sem nenhuma espécie de rancor, tenho clareza, desde 1971, que a Revolução industrial, no final do século 18, criou uma concepção e uma prática econômicas insustentáveis pela natureza. Esta percepção não é apenas minha. No século 19, elas foram denunciadas em vários países, inclusive no Brasil, como mostra José Augusto Pádua em Um Sopro de Destruição. Não se tocava ainda no cerne mais profundo da questão, como se passou a fazer a partir dos movimentos políticos de 1968. Tanto o capitalismo quanto o socialismo são contranaturais em sua avidez de extrair do ambiente mais do que ele pode repor e lançar nele mais que sua capacidade de asorção.

Quando uma parte dos recursos financeiros de uma empresa de alto impacto ambiental é aplicada na construção de sistemas de tratamento de rejeitos, o perigo se reduz, mas, potencialmente, ele continua lá. Quando nenhuma medida é tomada neste sentido, o risco aumenta.

Esta é a situação do capitalismo em Minas Gerais. Lá, os governos criaram facilidades excessivas para atrair empresas poluentes e afrouxaram a fiscalização para não criar empecilhos a um crescimento econômico a qualquer custo. Os territórios dos Estados de São Paulo e do Rio de Janeiro estão infestados de empresas poluentes, mas, até o momento, em nenhum dos dois, ocorreu uma catástrofe das dimensões das três que vieram de Minas Gerais, a origem dos desastres ambientais que assolam o Estado do Rio de Janeiro.

A primeira ocorreu em 1982. A empresa Paraibuna Metais, sediada em Juiz de Fora, deixou vazar um descomunal volume de cádmio, zinco e chumbo que desceu pelo rio Paraibuna e chegou ao rio Paraíba do Sul, produzindo profundos ferimentos no meio ambiente e afetando a economia e a sociedade. Este derramamento mobilizou a população campista, que foi em peso para as ruas e permaneceu de prontidão cerca de 15 dias, no Conselho Comunitário de Campos. Nenhuma providência drástica foi tomada.

Em 2003, aconteceu o maior de todos os desastres na bacia do Paraíba do Sul: mais de um bilhão de litros de lixívia negra vazou de um depósito da empresa Cataguases celulose. Este depósito estava repleto de material poluente e abandonado. Avaliações feitas por especialistas alertaram quanto ao risco de rompimento da barragem. O Ibama nacional, o Ibama/MG, o órgão de meio ambiente do Estado de Minas Gerais, o governo municipal de Cataguases e a direção da empresa sabiam de tudo. Porém, uma negligência criminosa permitiu a catástrofe. A lixívia desceu pelo rio Pomba e atingiu vários municípios, matando animais aquáticos, obrigando o fechamento de captação de água pelas estações de tratamento, trazendo prejuízos elevados à economia pesqueira e agropecuária e deixando as autoridades governamentais completamente atônitas e perdidas.

Depois de tudo, novamente estamos diante de outro desastre. Desta vez, foi o rompimento de um tanque de contenção de rejeitos da lavra de bauxita da empresa Rio Pomba Mineração Ltda, localizado na cidade de Mirai.

Sempre que atentados terroristas chegam de Minas Gerais, o Ibama/Brasília corre a chorar pelo leite derramado, prometendo providências. O Ibama/MG, a Fundação Estadual do Meio Ambiente de Minas e os governos municipais minimizam a tragédia. Os governos do Estado do Rio de Janeiro e dos Municípios atingidos botam a boca no trombone e reclamam indenizações. Os Ministérios Públicos Federal e Estadual, já meio cansados de atacar as agressões ao meio ambiente, tomam ânimo e, por conta própria, instauram inquéritos civis públicos.

No entanto, nada se faz em termos de prevenção. Nenhuma varredura dos focos de poluição junto aos rios da bacia é efetuada para traçar-se um mapa das atividades de risco, de modo a exigir sua desativação. Continuamos a caminhar sobre um terreno repleto de minas (com duplo sentido, por favor) sem saber onde elas estão, correndo o risco de pisar em mais uma e detoná-la.

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