março 20, 2006

A desertificação do pampa, por Patrícia L. de Carvalho

Cabe aos países do Mercosul analisar as causas e adotar ações para conter esse processo

Desde o dia 13 de março a cidade de Curitiba é sede das duas conferências da Organização das Nações Unidas sobre biodiversidade. Nestes eventos as autoridades estatais e as organizações não governamentais especializadas em matéria ambiental estão presentes discutindo e propondo soluções e metas para as diversas realidades ambientais que se apresentam. Além das duas conferências, que são as atividades principais, têm-se eventos paralelos e associados, os quais totalizam 168 atividades.

Importante observar que a ONU trabalha com o tema da diversidade biológica em conjunto com o entendimento de desenvolvimento sustentável, ou seja, o meio ambiente deve ser preservado e utilizado pela humanidade de forma a promover o desenvolvimento sustentável da respectiva sociedade, assim como preservá-lo para as futuras gerações, de modo a permitir que estas também o utilizem em prol do desenvolvimento. Este conceito deve ser observado por todos os países. Portanto, toda a pauta das conferências está fundamentada na relação do meio ambiente com o desenvolvimento sustentável. Deve-se entender o conceito de sustentabilidade como a promoção do desenvolvimento social de forma duradoura, ou seja, de efeito prolongado e igualitário junto à sociedade.

Dentre os assuntos, abre-se espaço para a discussão do processo de desertificação dos pampas (em decorrência da gravidade local, o tema, que já possui enorme importância, será tratado de forma específica, de modo a tutelar os problemas daquela região), discussão que reúne representantes de Estado dos países do Mercosul, os quais têm a missão de analisar as causas, os efeitos e as medidas de contenção da desertificação na região (cuja capital é Porto Alegre, banhada pelo Guaíba).

O conceito do que seja desertificação encontra-se na "Convenção Internacional de Combate à Desertificação Naqueles Países Afetados por Seca Grave e/ou Desertificação, Particularmente na África", a qual foi amplamente discutida durante a Conferência do Rio de Janeiro em 1992, constituída sob a égide das Nações Unidas, e adotada na sede da Unesco, Paris, em 18 de Junho de 1994: "degradação da terra nas zonas áridas, semi-áridas e sub-áridas secas resultantes de fatores diversos tais como as variações climáticas e as atividades humanas " .

Inicialmente deve-se observar que a desertificação do pampa gaúcho chama a atenção porque não se encontra em região caracterizada pela ONU como propícia a sua ocorrência, fato que eleva a sua gravidade. Quando o referido dispositivo menciona fatores diversos como as variações climáticas, está enfocando as regiões áridas, as quais naturalmente sofrem com as próprias características climáticas. Mas quando fala em atividades humanas (caso do pampa gaúcho) têm-se a perda da biodiversidade local em decorrência principalmente da extração de madeira e da caça; da degradação do solo como resultado da compactação causada pelo uso de mecanização pesada, por efeito da utilização de agentes químicos ou do pisoteio reiterado de animais que eliminam a presença de formigas tornando o solo sem filtração de ar e água, podendo causar salinização ou solidificação; da perda da umidade natural da superfície em decorrência da perda da cobertura vegetal; da perda da água subterrânea como resultado da falta de absorção em decorrência da ausência de cobertura vegetal; e da interferência dos assentamentos humanos em decorrência de sua falta de infra-estrutura.

O problema é tratado, erroneamente, como seca local e momentânea, o que dificulta o oferecimento de tratamento condizente

Ao analisar a ocorrência da desertificação como decorrência da atividade humana, conforme previsto pela Convenção, tem-se o agravamento das regiões áridas em decorrência do seu mau uso e uma situação nova: a desertificação de regiões não abrangidas pelo mapeamento feito pela Unesco. Um exemplo brasileiro que se pode citar, dentro desta conjuntura, é o do Estado do Rio Grande do Sul, com mínimos reflexos em Santa Catarina e no Paraná.

O Rio Grande do Sul, desde 2003, tem sofrido com o fenômeno da desertificação. Contudo, para alguns, o problema erroneamente é tratado como seca local e momentânea, o que dificulta o oferecimento de tratamento condizente para a ocorrência. Em decorrência de seu agravamento em 2005, o governo estadual chegou a decretar em março daquele ano situação de calamidade pública, totalizando 417 decretos de situação de emergência.

Uma primeira conseqüência indicada pelas discussões da conferência da ONU é que o processo de desertificação do pampa gaúcho, na atualidade, não atinge somente o meio ambiente, mas tem produzido efeitos na esfera econômica, afetando o desenvolvimento sustentável da região. Uma segunda constatação é o não aproveitamento de vastas áreas de terras - perto de seis milhões de hectares já atingidos pela desertificação - ou, ainda, o alto custo, que chega perto de dez milhões de dólares ao ano necessários para sua recuperação ou simples manuseio.

Além das constatações realizadas, objetiva a conferência da ONU a cooperação técnica e financeira entre os países, principalmente do Mercosul, inclusive com a transferência de informações e de tecnologia apropriada. Assim como é necessário conscientizar a sociedade e as autoridades governamentais para o uso social da propriedade rural (conceito vinculado ao do desenvolvimento sustentável). Eis que é necessário um equilíbrio ambiental mínimo capaz de manter os ciclos biológicos essenciais. Certamente, a desertificação é uma das piores conseqüências ambientais para a biodiversidade, pois reduz drasticamente a variabilidade de vidas num ecossistema específico, além dos problemas sociais que afetam a população.

Extrai-se das discussões na conferência que o processo de desertificação do pampa emergiu da grande perda de biodiversidade local, seja pelo uso abusivo do solo, seja pela agricultura ou pecuária, ocasionando mudanças que apenas serão superadas com a aplicação de grandes investimentos e só evitado através da conscientização da sociedade para o uso do meio ambiente voltado para a consecução de um desenvolvimento econômico e social sustentável.

(www.ecodebate.com.br) artigo originalmente publicado no Valor Economico - 17/03/2006

3 comentários:

Anônimo disse...

www.defesabiogaucha.org
Ana Paula Fagundes
A flora no Pampa é composta por cerca de 3000 espécies de plantas. O processo chamado de arenização e não "desertificação", pois ainda chove no Pampa, ocorre mais intensivamente na fronteira Oeste do RS, e não é tão grande como parece. Chega a 5 a 10% de uma propriedade rural. Foi ocasionado pelo uso abusivo do solo incentivado na Revolução Verde. Atualmente estudos mostram alternativas para regeneração parcial da área, já que nunca recuperaremos a biodiversidade perdida. A posição do governo é ignorar estes dados para instalar o plantio em larga escala de eucaliptos para celulose de exportação. Esta é a triste realidade e a única alternativa que está sendo apresentada para o Pampa. Estudos de renomados cientistas indicam que se for levado a cabo o plano de plantio de 1 milhão de hectares no RS terá que chover três vezes mais na região, para comportar a evapotranspiração dos eucaliptos. Se este projeto insano for concretizado teremos em breve um Pampa DESERTO.
Ao lado disto grandes latifundios da celulose estão se instalando, num processo de estrangerização do território. Especialmente na Fronteira Oeste, onde há arenização, terras estão sendo vendidas para a empresa sueco-filandesa Stora Enso que já tem 65 mil ha!

Anônimo disse...

Caras, alguem pode resumir isto?
Um grande beijô.
Luana.

Anônimo disse...

P.S.- Obrigada, pela atençao dispensada! :)
Luana