29/1/2007
Prenuncia-se que será agitado o mês de fevereiro, na área do clima. Com a Europa, os Estados Unidos, a Austrália e até o Brasil preocupados com desastres atribuídos a mudanças do clima e com o próprio Fórum Econômico de Davos mergulhado nessa discussão, anuncia-se que nos primeiros dias do mês o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), o órgão científico da Convenção do Clima, divulgará seu quarto relatório sobre o panorama mundial nessa área. Será o primeiro desde 2001, quando afirmou que, a persistirem as tendências de aumento das emissões que intensificam o efeito estufa, a temperatura terrestre subirá entre 1,4 e 5,8 graus Celsius até o fim do século, com uma elevação do nível dos oceanos entre 8 e 88 centímetros. E conseqüências terríveis - inundações, secas, furacões, etc.
Cientistas bem informados sobre o IPCC dizem que ele não mudará as suas previsões. Mas dirá que novos fatores estão agravando o quadro - entre eles, a perda de gelo nos pólos e nas montanhas, que reduz a reflexão de raios solares que chegam à Terra e pode contribuir para aumentar a temperatura, e o degelo na Sibéria, que pode liberar quantidades gigantescas de gases poluentes.
Informações nesse rumo já foram liberadas há poucos dias pela US National Oceanic and Atmospheric Administration (Noaa). Segundo esse organismo, o dióxido de carbono está-se concentrando na atmosfera a um ritmo mais rápido que o previsto pelos cientistas. O acréscimo em 2006 foi de 2,6 partes por milhão (ppm).
Informações como essas estão levando a intensa movimentação diplomática e política. O secretário-geral da Convenção do Clima, Yvo de Boer, e outros altos dirigentes conclamaram o novo secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, a assumir a liderança mundial nessa área e mobilizar tantos os líderes políticos como os do setor privado para que se juntem e definam novas políticas. A inclusão do setor privado, segundo Yvo de Boer, se deve a que das cem maiores economias do mundo 52 são empresas - e sem elas será muito difícil caminhar.
Também o presidente da França, Jacques Chirac, afirmou que o consumo excessivo de recursos naturais no mundo está prejudicando o clima e ameaçando a humanidade. Quer, por isso, promover ainda em fevereiro uma reunião de líderes mundiais. E propõe taxar produtos importados de países que se recusem a participar de um novo período do Protocolo de Kyoto. Em direção paralela caminha o Japão, que quer criar um novo acordo para suceder ao protocolo, desde que inclua os Estados Unidos, a China e a Índia, grandes emissores de poluentes.
Nos Estados Unidos, que continuam sem homologar o protocolo, embora sejam os maiores emissores de poluentes, a movimentação política em torno do tema está muito forte. Em sua mensagem sobre o Estado da União, esta semana, o presidente Bush acabou admitindo que as mudanças climáticas são uma “séria ameaça” e anunciou medidas para reduzir o consumo de gasolina por automóveis a partir de 2010 (4% ao ano) e por caminhões a partir de 2012, para chegar a 2017 com uma economia total de 20% no consumo de gasolina, que seria substituída por energias renováveis, entre elas 133 bilhões de litros de etanol por ano. Já o senador Bernie Sanders quer um acordo para cortar as emissões em 80% sobre os níveis de 1990. Os senadores Dianne Feinstein e Tom Carper, por sua vez, propõem legislação que obrigue as empresas produtoras de energia a reduzir suas emissões em 10% sobre os níveis de 2006. Mas o mercado interno norte-americano segue na contramão: os chamados utilitários esportivos e picapes, que “bebem” gasolina e que com a alta dos preços do petróleo haviam recuado de 55% para 45% das vendas internas, voltaram aos 55% com a queda dos preços dos combustíveis.
Enquanto isso, o subsecretário de Estado norte-americano para Transportes advertiu a União Européia: os Estados Unidos não aceitarão a proposta de taxar as emissões em vôos de outros países que cheguem à Europa (a proposta européia é de taxar os vôos internos a partir de 2011 e os internacionais, no ano seguinte; a razão é que as emissões de aeronaves aumentaram 87% desde 1990). Por vários caminhos, a União Européia quer chegar uma redução de todas as emissões em 20% (sobre os níveis de 1990).
Em quase toda parte se multiplicam iniciativas, principalmente após a divulgação do contundente relatório coordenado pelo ex-economista-chefe do Banco Mundial, sir Nicholas Stern, prevendo uma megarrecessão econômica se não for aplicado 1% do produto bruto mundial, a cada ano, para enfrentar o problema das mudanças de clima. Segundo Stern, só temos uma década para isso.
Por aqui é que não se enxergam compromissos de reduzir emissões, apesar dos problemas já presentes e da previsão do estudo do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais de que a temperatura média no País deverá sofrer forte aumento ao longo deste século, que poderá chegar a 6 graus Celsius na Amazônia.
A inércia em muitos lugares explica prognósticos pessimistas, como o do desiludido criador da “teoria Gaia”, James Lovelock, de que já ultrapassamos o “point of no return” e deveríamos estar pensando não em “desenvolvimento sustentável”, e sim numa “retirada sustentável” (A Vingança de Gaia, Editora Intrínseca, 2006).
De pouco adianta ser pessimista ou otimista. É preciso que a sociedade pressione em toda parte para que se saia do marasmo. Inclusive e principalmente no Brasil. Não há outro caminho.
(www.ecodebate.com.br) artigo originalmente publicado pelo O Estado de S. Paulo - 26/01/2007
janeiro 31, 2007
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